Três anos depois do desastrado referendo que confundiu o povo brasileiro com a falsa idéia de que votar sim ao desarmamento significaria desarmar o cidadão de bem, a criminalidade não reduziu e são cada vez maiores os números de homicídios com armas de fogo, que circulam livremente pelas comunidades, muito embora poucos tenham autorização para o porte. Armando-se, a população tem a falsa sensação de segurança e resgata práticas medievais de vingança privada, incompatíveis com o Estado de Direito. Enquanto isso, Alagoas, por mês, perde mais vidas humanas do que a Faixa de Gaza. Diante dessa situação incontrolável, o governo federal lança nova campanha voltada para o desarmamento, com o intuito de incentivar a entrega voluntária das armas. Essa é uma das frentes do combate à criminalidade violenta em todo o País, que não pode ser levada adiante sem uma reestruturação material e pessoal das polícias e sem uma mudança de paradigma nas políticas públicas de combate à violência. A segurança pública não pode se tornar uma questão privada e individualizada, alheia à atuação do Estado. Não é através do incentivo à própria violência, sobretudo com o uso de armas de fogo, que será resgatada a paz e a tranqüilidade em bairros e comunidades. Ao contrário, é preciso buscar alternativas que ultrapassem a cultura da repressão e da violência, norteadoras da maior parte das ações do Estado, e incentivar o real engajamento da sociedade civil, em parceria com o Poder Público, na revalorização da vida humana. Além disso, o Estado precisa resgatar a confiança e o respeito perdidos ao longo dos anos em que o povo brasileiro sentiu-se órfão e entregue à própria sorte, não apenas pela omissão estatal, mas também pelas circunstâncias em períodos em que o próprio Estado passou a representar uma ameaça à liberdade e à dignidade humana. Por outro lado, não se pode confundir o incentivo ao protagonismo do povo no processo de redução da violência e da criminalidade com práticas violentas capazes de embrutecer os indivíduos e criar uma atmosfera de pânico que em nada contribui para a paz. Ainda que as armas de fogo sejam instrumentos sedutores para muitos, é certamente por outras vias que a situação atual será revertida. Ao invés de armas de fogo, precisamos de instrumentos de paz. Esse é o nosso maior desafio.
Publicado na Gazeta de Alagoas, em 05/09/2008
http://gazetaweb.globo.com/v2/gazetadealagoas/texto_completo.php?cod=133964&ass=37&data=2008-09-05