O contato cotidiano com alunos de graduação, formandos e recém-formados, da área jurídica, tem sido muito enriquecedora na minha vida, por uma série de fatores. Quem vive o cotidiano da Academia e se encanta com a pluralidade de olhares e possibilidades na produção do conhecimento sabe do que estou falando.
No entanto, ao mesmo tempo em que tenho visto muitas pessoas interessantes, engajadas em projetos voltados para o social e compromissadas com a ética e a justiça, deparo-me com estudantes que têm uma única perspectiva na vida: passar em um concurso, qualquer que seja! Dons, aptidões, afinidades, para eles, são cartas fora do baralho. O que importa é a estabilidade financeira. Absurdamente, essas pessoas se autodenominam CONCURSEIROS!
Em que pese ser a estabilidade um fator importante, sobretudo no panorama econômico de hoje, penso que não pode ser ela a centralidade das escolhas profissionais no campo do Direito. Quando isso acontece, o resultado é uma legião de frustrados, com estabilidade e dinheiro no bolso. Ainda assim, FRUSTRADOS.
As profissões jurídicas são muito diferentes. Atuar na magistratura, no Ministério Público ou na Defensoria Pública, só para citar esses, significa estar diantes de formas distintas de contato com a prática jurídica. Como ser Defensor Público, por exemplo, quando não se tem qualquer vocação e tato para lidar com pessoas humildes? Como ser juiz, se não consegue lidar com suas paixões diante de uma decisão que, em tese, deve ser imparcial? Eu poderia fazer uma série de perguntas dessa natureza, mas penso que esses exemplos são suficientes para ilustrar o que percebo hoje em dia. A procura por concursos (qualquer um!) é tão presente no cotidiano dos estudantes, que algumas faculdades chegam a elaborar avaliações e provas de acordo com as tendências dos concursos. Ao invés de formar juristas, essas faculdades formam concurseiros.
Não estou negando a importância dos concursos públicos. Ao contrário, penso que para aqueles que não se identificam com a advocacia (tão vocacionada quanto o magistério na área jurídica, na minha opinião) é natural a busca por um emprego público. O que questiono, aqui, é a ausência de qualquer afinidade dos futuros profissionais com os cargos que ocuparão. Não vejo uma preocupação em construir uma relação de identidade com o papel que desempenharão na imensa rede de profissões jurídicas. A ausência dessa identidade acarreta no panorama que temos hoje: profissionais tecnicamente preparados, mas pouco compromissados com a essência do cargo que ocupam. São concursados, mas não são profissionais, pois não trazem consigo a consciência do seu papel social.
Entendo que a escolha de uma profissão é parte essencial na vida de uma pessoa. É tão importante quanto a realização pessoal. Tudo isso, porém, não tem regras. Cada um sabe a medida da sua felicidade. Por isso, é preciso encantar-se com a profissão que se busca, conhecê-la bem e, se for o caso, estabelecer uma verdadeira aliança com ela. Parece um casamento, não? É mais ou menos isso: pode até haver o divórcio mais adiante, mas casa-se com o desejo de que dure para sempre.
7 comentários:
É isso mesmo minha filha. Para escolher uma profissão em qualquer área que seja, são necessários dons,aptidões, vocação e muito amor para o bom relacionamento entre colegas, alunos ou subalternos e sobretudo para a execução das atividades designadas ao profissional. Parabéns pelo incentivo aos futuros profissionais,quer seja no curso de Direito ou outra área. Beijos da Mamãe.
Não tenho como deixar de concordar. Vejo isso acontecer amiúde.
Interessante observar duas coisas: salvo engano meu, cuida-se de fenômeno relativamente recente. Lembro que quando estudei na Ufal, a partir de 1991, apenas uns poucos falavam em concurso público como objetivo de vida, independentemente do cargo. Não havia esse monte de faculdades de direito e, até então, jamais se ouvira falar em cursinho preparatório para concursos. Hoje, um amigo meu, ficou estarrecido quando seus alunos de graduação disseram que não queriam aulas muito teórias e pediram que resolvesse questões de concurso.
A segunda constatação diz respeito ao próprio curso de direito: outro amigo, sendo esse da área de exatas, disse que, por força do mercado de trabalho, talentos de outros ramos do saber estariam se submetendo ao curso de direito, sem vocação, simplesmente para garantir um futuro melhor. Essas mentes brilhantes seriam seguidas por uma multidão de mentes não tão brilhantes, todos em busca da mesma coisa.
A culpa, em minha opinião, antes de ser dos estudantes, seria da atual conjuntura social.
Seria ótimo se todos os ramos pudessem ter as mesmas oportunidades de crescimento profissional e social. Muitos talentos, que hoje são concurseiros (por necessidade, não os culpo), poderiam ser destacados agentes criativos, na iniciativa privada, muitas vezes donos de seus próprios negócios.
É, verdade, Beto. Seria muito bom que todos tivessem as mesmas oportunidades...
Beijos da irmã.
Beijos para Mamãe, a mais importante comentadora do meu blog!!!
Eu acredito que a grande maioria entra na academia com os olhos brilhando, com o desejo real de serem juristas. Porém, acabam o curso concurseiros. Concordo com vocês quanto ao motivo, é todo um conjunto de fatores que os(nos) empurravam a isso.
Digo isso, por exemplo, pela minha própria sala na faculdade, contava-se nos dedos quem não queria concurso, sem falar nos quase 60% já concursados ao longo dos cinco anos de graduação. E, de certeza, dentre essa estatística citada, havia muitos que sonhavam em ser juristas.
Obrigada...filhotinha,você é mesmo muito fofa!!!!!!!!!muitos beijos da mamãe-coruja.
Fiz essas reflexões sobre os profissionais da área jurídica, mas isso se estende a todas as profissões. Há médicos, dentistas, engenheiros etc. cursando Direito só para "arrumar um emprego melhor", ou seja "passar em concurso". É lamentável...
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