quinta-feira, 12 de março de 2009

Elas cantam Bossa Nova no Santa Luzia


Aconteceu ontem, no Santa Luzia, único presídio feminino de Alagoas. Ainda em comemoração à semana da mulher, a Secretaria da Mulher, Cidadania e Direitos Humanos, atraés da secretária Wedna Miranda, promoveu um dia de cidadania para as mulheres presas. Foram realizados atendimentos médicos, balcão de direitos para a confecção de RG e CPF, além de revisão dos prontuários das reeducandas com a colaboração de defensores públicos, promotores de justiça e juízes. Não foi possível fazer revisão dos processos, já que os autos não chegaram ao presídio a tempo. No entanto, os profissionais do Direito ali presentes verificaram as aberrações jurídicas presentes nos processos daquelas mulheres e deixaram agendado um "mutirão" para revisão de todos os processos (no dia 03/04/2009), para o qual está prevista a redução de 40% da população cercerária. O Santa Luzia conta, atualmente, com 116 mulheres presas, das quais apenas 7 são condenadas. Todas as demais aguardam julgamento e a grande maioria dos processos tramita nas comarcas do interior do Estado de Alagoas. Um verdadeiro absurdo que demonstra o descaso da nossa Justiça com essas pessoas.
O dia de cidadania foi encerrado com o show "Elas cantam Bossa Nova", realizado na quadra de esportes do Santa Luzia. Na platéia, todas as reeducandas, que animadamente dançavam ao som de Fernanda Guimarães, Leureny, Wilma Miranda e Elaine Kundera. Ao final, as reeducandas pediram que tocassem reggae e, de improviso, Fernanda Guimarães puxou meia dúzia de músicas que levaram a platéia ao delírio. E eu, também cantando e dançando com elas, fotografei tudo (ver foto acima). Embora o corpo de agentes penitenciários estivesse temeroso de que pudesse haver algum problema pelo fato de o show acontecer na parte externa do presídio, a alegria e a tranquilidade contrariaram qualquer previsão nefasta. Foi um momento maravilhoso.


O dia de ontem me lembrou um outro show que aconteceu no antigo presídio São Leonardo, também em Maceió, no ano de 2001, quando Tutmés Airan era Secretário de Justiça e Cidadania. Também contrariando o temor geral de que aquele momento cultural se tornasse uma oportunidade para motim ou rebelião, Tutmés conseguiu levar ao presídio o cantor Luiz Carlos, do grupo de pagode "Raça Negra". Luiz Carlos cruzou o enorme pátio do presídio São Leonardo sem grande aparato de segurança, cumprimentou os presos com atenção e cantou, ao vivo, os maiores sucessos do grupo. Nem sei descrever aquele momento. Todos cantaram e dançaram em paz, aplaudiram fervorosamente e certamente guardaram na memória aquele momento de alegria. Eu guardo aquele dia, assim como o dia de ontem, no rol dos momentos mais felizes da minha vida.

7 comentários:

Bruno Lamenha disse...

E que não duvidem do potencial transformador da arte.. seja no presídio, seja fora dele.. =)

Humberto disse...

Deve ter sido um momento e tanto.
Emocionante a sua narrativa.
Parabéns.
Bjs

Jomery Nery disse...

Elaine,
sua narrativa contagia o mais cético político de todos nós. Realmente a arte rompe as fronteiras e aproxima as pessoas. No caso aproxima as reeducandas do convívio social, fazendo-as reviver a entusiasmante emoção de estarem "naturalmente livres".
Obrigado por me fazer conhecer, com tanta emoção, as tuas experiências no presídio.
Beijo

Eulina Costa disse...

Que lindo,minha Filha! Sua narrativa é maravilhosa,vc me encanta sempre com suas experiências e vivências,Deus a ilumine e ajude aquelas mulheres reconquistar a liberdade e voltar ao convívio familiar. Que maravilha, o show das grandes cantoras de Alagoas para as reeducandas, comemorando o Dia Internacional da Mulher, parabenizo quem autorizou a festa. Beijos da Mamãe.

Leda Almeida disse...

Oi Elaine, antes de tudo, parabéns pelo seu "feminismo".
Olha, estou precisando do e-mail da Ruth Vasconcelos, vc tem? poderia me enviar? Me manda por e-mail: ledaguerra@hotmail.com
beijos doces!
tenha um lindo final de semana!

Ruth disse...

Querida Elaine, realmente foi um momento muito emocionante para todas nós. Partilhar aquela alegria com as mulheres do presídio, com aquelas cantoras maravilhosas, com você e minha filha foi uma experiência única. A sociedade precisa entender que a população carcerária é constituída de seres humanos que têm os mesmos desejos dos que estão fora das grades. Ou seja, elas querem um tratamento digno, querem poesia e música, assim como assistência médica, educacional, psicológica, assistência jurídica etc. É lamentável saber que muitas mulheres só estão no presídio porque não têm recursos para contratar um advogado. Talvez esta violência produzida pela insuficiência do Estado na defesa dos direitos humanos e na promoção de condições dignas para essas mulheres seja mais grave do que muitos delitos que algumas cometeram e que determinaram a perda de sua liberdade. Atos de cidadania como este, promovido pela Secretaria da Mulher, Cidadania e Direitos Humanos, através da secretária Wedna Miranda precisam ser contínuos. A vivência que tivemos naquele momento me faz acreditar e ter esperança de podermos construir um mundo melhor, mais justo e igualitário. O caminho é longo! Ainda que saibamos da urgência de mudanças estruturais para que esta realidade mude efetivamente, não podemos deixar de oferecer esses gestos de carinho e gentileza, pois um dia de alegria para aquelas mulheres certamente torna menos árduo o tempo de reclusão que ainda terão que viver no Santa Luzia, até que sejam julgadas. Certamente a revisão dos processos, no dia 03 de abril, implicará na soltura de muitas mulheres que talvez nem devessem ter sido presas. É lamentável que exista essa possibilidade.

Thales Prestrêlo disse...

Eita que coisa boa, Elaine!
Imagino a felicidade delas e o sucesso que foi esse evento!

E claro que pra elas realmente o reggae não poderia faltar né? kkkkkkkkkkkkk Que saudade dos nossos encontros embalados por muita música! :D

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