quinta-feira, 20 de novembro de 2008

Dia da Consciência Negra




Hoje é o Dia da Consciência Negra. Em Alagoas, terra de Zumbi dos Palmares, o feriado é comemorado, principalmente, pelas comunidades quilombolas e pelos movimentos sociais afro-descendentes. O que se comemora no dia de hoje? Comemora-se a liberdade e a igualdade jurídica, algo negado durante séculos na história humana e, em particular, no Brasil. Lamentáveis episódios de racismo e de intoletância étnica ainda são testemunhados todos os dias, inclusive dentro das próprias instituições do Estado. Assim, a data festiva não é apenas um marco de celebração, mas, sobretudo, uma forma de relembrar, a cada ano, que embora tenhamos alcançado a igualdade na esfera constitucional, ainda temos um longo caminho a percorrer para que os negros sejam reconhecidos, de fato, como sujeitos de direitos. Espero que um dia todos possam perceber que só há uma raça: a raça humana.

sexta-feira, 14 de novembro de 2008

Triste ranking...




A cidade de Maceió aparece, atualmente, no topo do ranking das cidades mais perigosas do País. Fatos e notícias que há poucos anos assistíamos pela televisão e pareciam ser coisa apenas de grandes metrópolis, como São Paulo e Rio de Janeiro, agora são o cotidiano da capital alagoana. Balas perdidas que matam crianças, chacinas, comando do tráfico expulsando moradores de favelas... Ao lado, a capa da Gazeta de Alagoas de hoje traz duas notícias graves e demonstra a vulnerabilidade das nossas periferias. É triste conviver com esse paradoxo: uma cidade tão linda, tão agradável, marcada por cotidianos episódios de violência. É preciso muita cautela no trato com essas questões. O Estado já não pode mais tratar o problema da segurança pública como coisa só de polícia. Há algo muito maior por trás da violência e da criminalidade. Um olhar mais atento e sensível permitirá, certamente, uma reflexão mais adequada e, consequentemente, medidas mais eficazes para o resgate da paz em Alagoas.

terça-feira, 11 de novembro de 2008

Sem palavras...



Mais um crime bárbaro entristeceu o povo brasileiro. O brutal assassinato da menina Rachel Genofre, em Curitiba, traz à tona, mais uma vez, o problema da pedofilia. Segundo o laudo pericial, a menina foi vítima de violência sexual e morta por asfixia. A polícia já prendeu um suspeito e investiga a possibilidade de ser ele, de fato, o assassino, através de exame de DNA, grande aliado para a elucidação do crime. A pedofilia é algo de muita complexidade. Pensei em escrever uma reflexão sobre a pedofilia aqui, mas não tive inspiração: a torpeza do crime me silenciou.

domingo, 9 de novembro de 2008

Jogos Internos da UFAL


Entre os dias 7 e 27 de novembro acontecerão os Jogos Internos da UFAL, 2008. Várias são as modalidades de jogos, tanto individuais (natação, xadrez, etc), quanto coletivos (futsal, voleibol, basquete e handebol), femininos e masculinos. É um importante momento de integração entre os alunos dos mais diversos cursos. A abertura dos jogos ocorreu na sexta-feira, dia 7, no pátio da Reitoria, com a presença da Banda de Fanfarra D. Pedro II, de Rio Largo. O curso de Direito terá participação maciça dos alunos, que jogarão em todas as modalidades. Flagrei os alunos Charles e Amália na abertura e resolvi homenageá-los aqui. Vale a pena conferir a programação. Aos meus queridos alunos, boa sorte!

quinta-feira, 6 de novembro de 2008

Charge de Ênio Lins


Como era de se esperar, as manchetes dos jornais de hoje, no mundo inteiro, fazem menção ao presidente eleito Barack Obama. O destaque é o fato de que se trata do primeiro negro a ocupar a Casa Branca. A questão racial sempre foi um dos principais focos de hiprocrisia do povo americano, levado constantemente a reproduzir práticas de intolerância contra negros. Obama não fez uso de sua negritude ao longo da campanha. Seu propósito, parece-me, foi demonstrar que a democracia está acima de questões raciais (embora não se possa fechar os olhos para ela...) e que a sua capacidade de administrar a mais rica nação do mundo não pode ser mensurada pela cor da pele. A questão inspirou o chargista Ênio Lins, da Gazeta de Alagoas. Haja criatividade...

quarta-feira, 5 de novembro de 2008

Uma vitória da democracia


O dia de hoje vai ficar marcado na história da humanidade como o dia em que a democracia, mais uma vez, venceu. A vitória de Barack Obama para a presidência dos Estados Unidos representa uma importante transição, não apenas porque o tenebroso governo de George Bush passa a ser coisa do passado, mas, sobretudo, porque o novo Presidente - o primeiro negro a ocupar a Casa Branca - chega com um discurso de pacificação e respeito às minorias. É certo que a perspectiva de mudança tende a criar ídolos e heróis, mas ainda é cedo para avaliarmos o que virá pela frente. Só conheceremos Obama ao longo do tempo e diante das deciões concretas que tomará como Presidente, especialmente nos momentos de crise. Mesmo assim, momentos de ruptura como esse que estamos vivenciado são simbolicamente importantes, pois fazem renascer, em muitas pessoas, a esperança de dias melhores. Espero que Obama, como líder da maior potência mundial, governe, de fato, em favor da democracia.

domingo, 2 de novembro de 2008

Direitos humanos e cidadania no presídio Santa Luzia




A atividade acadêmica tem a capacidade de nos proporcionar experiências muito interessantes, que marcam as nossas vidas. A extensão acadêmica, em particular, leva professores e alunos a um contato maior com a realidade, de modo que a teoria estudada possa ser vivenciada na prática. Esse é um dos principais papéis das Universidades: proporcinar aos alunos uma formação profissional comprometida com a realidade social e, assim, tornar-se instrumento de transformação social.
A minha primeira experiência em atividades de extensão, no programa PROAPEX/UFAL está em andamento. Tem por objetivo levar o debate dos direitos humanos e da cidadania ao Estabelecimento Prisional Feminino Santa Luzia, único presídio feminino de Alagoas. Desde agosto, eu e oito alunos (Mayara Bittencourt, Anderson Luiz, Georgina Bomfin, Thales Prestrêlo, Bruno Lamenha, Amanda Mattos, Sofia Viana e Manoel Bernardino), da graduação em Direito da UFAL, vamos semanalmente ao Santa Luzia, com o propósito de debater temas sobre direitos humanos e cidadania. Fomos muito bem recebidos e temos vivenciado momentos inesquecíveis. A população carcerária, carente em vários aspectos, encontra na nossa presença a possibilidade de dialogar e conhecer um pouco mais sobre os seus direitos. Como todo espaço de fala, ouvimos muito mais do que falamos e esse talvez seja o elemento mais importante da nossa atividades: ouvir o que pensam sobre seus direitos e cidadania. Tenho certeza de que até dezembro, quando termina o nosso período de extensão universtária, nosso grupo vai vivenciar muitas experiências interessantes, que marcarão não apenas as nossas vidas, mas também as vidas daquelas mulheres. Ao lado, a imagem do banner que elaboramos para apresentar a síntese do nosso trabalho no Congresso Acadêmico 2008, com fotos que tiramos ao longo dos meses de setembro e outubro. Nossas idas ao Santa Luzia deixarão saudades.

quinta-feira, 30 de outubro de 2008

Música inteligente em Marechal Deodoro





Acabo de chegar do recital de Arthur Moreira Lima na Praia do Francês, no município de Marechal Deodoro. Trata-se da 264ª apresentação do pianista no projeto "Um piano pela estrada 2008", que já passou por diversos Estados do Brasil, levando música de qualidade a pequenas cidades do interior. É uma oportunidade ímpar para a população local ter acesso a um momento tão sublime. Em Alagoas, a única apresentação precedida pela apresentação da Camerata Pró-Música de Alagoas, que trouxe belas canções executadas em violão clássico, oboé e piano, além das belíssimas vozes dos cantantes. O repertório escolhido por Moreira Lima envolve desde clássicos de Mozart, Chopin, Bethoveen e Villa-Lobos, até músicas de Piazzola, Pixinguinha e Luiz Gonzaga. Saí de lá cantarolando: "Meu coração, não sei por que..."

sábado, 25 de outubro de 2008

Página do NEVIAL

Finalmente está no ar a página do Núcleo de Estudos sobre a Violência em Alagoas, da UFAL. Ainda está em fase inicial, mas já apresenta a estrutura e as linhas de pesquisa do nosso NEVIAL. Visitem: http://nevial.wordpress.com.

quarta-feira, 22 de outubro de 2008

Tragédia passional

Há pouco mais de uma semana o Brasil parou para "assistir" o drama da adolescente Eloá, feita refém por seu ex-namorado, inconformado com o término do relacionamento. Depois de Isabella Nardoni, foi o caso de maior visibilidade na mídia nacional. Em algumas emissoras da televisão, a tensa situação vivida no interior daquele apartamento em São Paulo tornou-se mais um espetáculo rentável, vendido como mercadoria para um público ávido por tragédias. Em nome da informação, vale tudo, até mesmo interferir nas negociações entre a polícia e o sequestrador. Antes mesmo que os policiais estabelecessem contato com o autor do crime, a mídia já o colocava em rede nacional, explorando erroneamente muitos aspectos subjetivos delicados, sobretudo diante da visível situação de transtorno emocional pela qual passava o algoz. Sentindo-se protagonista do drama ali vivido, Lindemberg teve o controle da situação por mais de cem horas. Os negociadores não eram apenas os policiais, mas os jornalistas e a própria sociedade civil, que opinava sobre o caso, mandando “recados”, ao vivo, para o seqüestrador. Não quero nem entrar no mérito do desastroso retorno da segunda refém, Nayara, para o interior do apartamento. É difícil, até mesmo para um leigo, acreditar que a polícia tenha permitido tal conduta. Além disso, se a polícia invadiu o apartamento antes ou depois de ouvir tiros, é a investigação quem vai comprovar. O fato é que, o trágico final daquele drama demonstra, mais uma vez, a forma amadora de tratar questões que envolvem a complexidade humana. A ausência de profissionalismo entre alguns dos que atuam nas situações-limite do ser humano, sobretudo na esfera das práticas criminosas, acaba por comprometer o andamento de negociações e investigações policiais. O caso de Eloá foi mais um crime passional. Entretanto, passional também foi a atuação da imprensa, que de forma irresponsável espetacularizou uma tragédia. E ainda questionam se foi uma bala da polícia ou do seqüestrador que matou Eloá...

sábado, 18 de outubro de 2008

Congresso Acadêmico 2008



Acontecerá, entre os dias 20 e 25 de outubro, o V Congresso Acadêmico da Universidade Federal de Alagoas. Com uma vasta programação em cada Unidade Acadêmica, o Congresso abrirá o debate sobre temas interessantes, através de conferências, mesas-redondas, painéis e minicursos. No curso de Direito, além de 22 minicursos, haverá apresentações de trabalhos de alunos da Graduação (PIBIC, Extensão, Monografias e outros) e do Mestrado. Durante o Congresso Acadêmica ocorrerá, também, a Reunião Regional da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e Alagoas, com vasta programação, que contempla tema de diversas áreas do saber. Será, portanto, uma semana voltada para a produção acadêmica. Imperdível!

sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Olha o NEVIAL aí, gente!


Hoje a Assembléia Geral do Núcleo de Estudos sobre a Violência em Alagoas - NEVIAL (UFAL) reuniu-se com o intuito de aprovar seu Regimento Interno e proceder à escolha de Coordenadores e Subcoordenadores. Definimos as linhas de pesquisa e fizemos planejamentos a curto e longo prazo. Já temos diversos trabalhos e pesquisas vinculadas ao NEVIAL, mas, a partir de agora, passaremos a desenvolver pesquisas dentro do próprio Núcleo, formando nosso banco de dados sobre violência e criminalidade em Alagoas. Com uma base interdisciplinar que prima pela pluralidade na produção do conhecimento, o NEVIAL abre espaços democráticos para um amplo debate acadêmico. É com esse perfil que o nosso Núcleo, coordenado pela Professora Ruth Vasconcelos, já participa de iniciativas do Governo do Estado, a exemplo do Observatório da Violência e da sociedade civil organizada, com o Fórum Permanente contra a Violência. Em breve colocaremos no ar o Blog do NEVIAL.

quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Ao Mestre, com carinho


Hoje é comemorado o Dia do(a) Professor(a). É, de fato, uma dia a ser celebrado. Ser professor é um grande desafio, seja qual for o âmbito de atuação desse profissional. Em escolas e universidades públicas, os professores lutam a cada dia pela qualidade do conhecimento produzido, mesmo diante das adversidades materiais, do sucateamento e da falta de estrutura. Já nas particulares, outros são os entraves do cotidiano. Em comum entre todas elas: a figura do professor, cuja atividade não começa nem termina na sala de aula. São horas de leitura, preparação de aulas, correção de trabalhos e provas. Todo professor, de uma forma ou de outra, marca a vida de seus alunos. Quando essas marcas ficam nas melhores memórias, é porque o professor, certamente, cumpriu seu papel de mestre. Guardo na memória muitos dos professores e professoras que marcaram a minha vida. Vejo em mim, nas atividades de sala de aula e de pesquisa, um pouco de cada um. Às vezes, surpreendo-me utilizando uma palavra, um gesto, uma atitude de um ou outro professor. É a minha forma, ainda que inconsciente, de prestar o meu tributo a todos aqueles que me constituíram como intelectual. Deixo aqui, hoje, minha homenagem a todos os que, como eu, compartilham o conhecimento, com amor e respeito aos alunos, aprendendo com eles a cada dia. Feliz Dia do Professor!

domingo, 5 de outubro de 2008

20 anos de democracia



Há exatos 20 anos era promulgada a Constituição da República Federativa do Brasil. Principal marco legal da transição da ditadura militar para a democracia, a Carta de 1988 colocou em destaque a dignidade humana e permitiu uma releitura do conceito de cidadania. Nessas duas décadas, o povo brasileiro protagonizou a vida política da Nação, participando de importantes decisões através do voto direto e secreto, fundamental para o livre exercício da cidadania. Neste ano, o aniversário da Constituição Federal coincide com as eleições municipais. Em todo o Brasil, o povo está mobilizado para escolher prefeitos e vereadores, seus representantes mais próximos. Embora as eleições diretas sejam sinônimo de liberdade, a presença da Polícia Militar e do Exército se faz necessária em algumas cidades do interior do Alagoas, onde o clima é tenso e marcado por pequenos conflitos. É o paradoxo LIBERDADE X FORÇA, que se faz necessário porque os conflitos de interesse que estão ao redor de mandatos eletivos normalmente não se resolvem na esfera jurídica, mas através da violência, sobretudo diante do grande número de candidatos que figuram como réus em processos criminais em Alagoas. Ainda assim, quero olhar para o processo democrático com bastante otimismo, pois entendo que cada eleição reforça a luta que foi travada pelos resistentes da ditaduta militar que reescreveram a história da liberdade no Brasil e permite a possibilidade de alguma renovação nas estruturas de poder. Preciso sair agora: vou exercer minha cidadania.

quinta-feira, 18 de setembro de 2008

CARAVANA DA ANISTIA DO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA EM ALAGOAS

Acontecerá amanhã, dia 19/09/2008, no Palácio do Governo, a CARAVANA DA ANISTIA DO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA EM ALAGOAS.
Eis a programação:
9:00h
Palestra: "Tortura: Crime contra a Humanidade"
Profª Elaine Pimentel (Profaª Ms. de Direito da UFAL)
9:30h
Palestra: "Os Efeitos do Crime de Tortura no Campo da Subjetividade Humana"
Profª Ruth Vasconcelos (Profª Drª de Sociologia)
10:00h
I N T E R V A L O
10:15h
Palestra: "A Responsabilidade dos Torturadores do Perí­odo do Regime de Exceção (O Manifesto dos Juristas)
Dr. Everaldo Bezerra Patriota (Pres. do Cons. Estadual de Defesa dos Direitos Humanos)
10:45h
Palestra: "Uma Breve História dos Perseguidos Políticos de Alagoas"
Geraldo Magela (ex- militante do PCB)
11:15h
Palestra: "A Anistia Política no Brasil e a Comissão da Anistia do Ministério da Justiça
Narciso Fernandes Barbosa (Conselheiro da Anistia e Consultor do PRONASCI)
À tarde haverá uma Sessão de Especial de Julgamento da Comissão da Anistia do Ministério da Justiça para a apreciação de requerimentos de anistia de alagoanos.
A entrada é gratuita e serão fornecidos certificados para os participantes.

sábado, 13 de setembro de 2008

Desonrada, de Mukhtar Mai







Tenho lido muito coisa no campo de estudos de gênero e sempre sou surpreendida por uma perspectiva diferente ou uma reflexão inovadora, muito embora alguns desavisados questionem se ainda é necessário tratar da questão feminina no mundo de hoje. Resisto em declarar-me feminista, já que não milito em movimento de mulheres, mas convivo com muitas feministas militantes que pautam suas ações em teorias feministas muito lúcidas, atentas a outras questões que estão emaranhadas no debate de gênero, como as desigualdades de raça e de classe. Assim, procuram fugir do padrão de feminismo higienizado de outrora, escrito por mulheres brancas e burguesas. Uma das questões mais interessantes do feminismo teórico é que ele jamais será meramente teórico, já que é na vivência que ele se estrutura e se reescreve. Por isso, as pesquisas feministas e de gênero, no Brasil, focalizam os problemas típicos da realidade brasileira, dos diferentes Estados da Federação e das diversas comunidades, urbanas ou rurais. Seja no espaço público ou privado, o debate de gênero se impõe como necessário para compreender a própria dinâmica do cotidiano brasileiro.

Há, no entanto, algumas questões relacionadas às mulheres que, mesmo não compondo a realidade brasileira, tornam-se universalizados e precisam ganhar mais visibilidade, como é o caso das mulheres do Afeganistão. O livro Desonrada, nesse sentido, marcou sobremaneira a minha percepção acerca da questão feminina. Escrito em primeira pessoa, o livro narra a absurda situação vivida por Mukhtar Mai, violentada por quatro homens de um clã vizinho ao seu, nas longínquas montanhas do Afeganistão. Motivo? Pagar por uma "falta" de seu irmão mais novo, que ousou conversar com uma jovem do tal clã. É impossíve não se emocionar ao trilhar cada linha dos relatos de superação pessoal do trauma vivido e de luta para que episódios como aquele não aconteçam mais. Sem adentrar em detalhes sobre a violência que sofreu, Mukhtar Mai nos apresenta uma narrativa muito sensível sobre os tortuosos caminhos na busca pela justiça e demonstra uma grande generosidade pessoal ao transformar a dor vivenciada em um ativismo feminista, que tem como marco inicial a criação de uma escola para meninas, coisa inexistente na região, até então. Longe de qualquer teorização da condição feminina no mundo contemporâneo, o livro coloca o leitor diante de uma realidade concreta e permite um olhar mais amplo e profundo sobre dramas humanos que nós, ocidentais, ignoramos. Fica aqui a recomendação de leitura.

sexta-feira, 5 de setembro de 2008

Instrumentos de paz

Três anos depois do desastrado referendo que confundiu o povo brasileiro com a falsa idéia de que votar sim ao desarmamento significaria desarmar o cidadão de bem, a criminalidade não reduziu e são cada vez maiores os números de homicídios com armas de fogo, que circulam livremente pelas comunidades, muito embora poucos tenham autorização para o porte. Armando-se, a população tem a falsa sensação de segurança e resgata práticas medievais de vingança privada, incompatíveis com o Estado de Direito. Enquanto isso, Alagoas, por mês, perde mais vidas humanas do que a Faixa de Gaza. Diante dessa situação incontrolável, o governo federal lança nova campanha voltada para o desarmamento, com o intuito de incentivar a entrega voluntária das armas. Essa é uma das frentes do combate à criminalidade violenta em todo o País, que não pode ser levada adiante sem uma reestruturação material e pessoal das polícias e sem uma mudança de paradigma nas políticas públicas de combate à violência. A segurança pública não pode se tornar uma questão privada e individualizada, alheia à atuação do Estado. Não é através do incentivo à própria violência, sobretudo com o uso de armas de fogo, que será resgatada a paz e a tranqüilidade em bairros e comunidades. Ao contrário, é preciso buscar alternativas que ultrapassem a cultura da repressão e da violência, norteadoras da maior parte das ações do Estado, e incentivar o real engajamento da sociedade civil, em parceria com o Poder Público, na revalorização da vida humana. Além disso, o Estado precisa resgatar a confiança e o respeito perdidos ao longo dos anos em que o povo brasileiro sentiu-se órfão e entregue à própria sorte, não apenas pela omissão estatal, mas também pelas circunstâncias em períodos em que o próprio Estado passou a representar uma ameaça à liberdade e à dignidade humana. Por outro lado, não se pode confundir o incentivo ao protagonismo do povo no processo de redução da violência e da criminalidade com práticas violentas capazes de embrutecer os indivíduos e criar uma atmosfera de pânico que em nada contribui para a paz. Ainda que as armas de fogo sejam instrumentos sedutores para muitos, é certamente por outras vias que a situação atual será revertida. Ao invés de armas de fogo, precisamos de instrumentos de paz. Esse é o nosso maior desafio.

Publicado na Gazeta de Alagoas, em 05/09/2008

http://gazetaweb.globo.com/v2/gazetadealagoas/texto_completo.php?cod=133964&ass=37&data=2008-09-05

segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Bem-vindos a setembro!

Hoje é o primeiro dia do mês de setembro. É o mês do ano que mais gosto. Não, não é o mês do meu aniversário, mas é um mês sempre muito feliz. Talvez seja a proximidade da primavera, com todo o seu simbolismo. Meu post de hoje é uma singela homenagem a este belo mês.

domingo, 31 de agosto de 2008

Mundo em movimentos

A blog Mundo em movimentos, do meu amigo Sérgio Coutinho, é um espaço que tem sempre algo de muito bom para a nossa reflexão. Além de informações sobre os principais acontecimentos acadêmicos e sociais - sobretudo ligados aos movimentos sociais -, o blog traz reflexões muito lúcidas sobre cinema e artes. Chamo a atenção para a post de hoje, que trata do filme "O nevoeiro", analisando a reprodução de uma ideologia hegemônica dos norte-americanos. Vale a pena conferir, não só o texto de hoje, mas tudo de bom que o blog tem para nos oferecer.

Revista Psique Ciência & Vida


O nº 31 da revista Psique Ciência & Vida trouxe matérias muito interessantes, mas também cometeu alguns deslizes. A foto estampada na capa apresenta uma idéia equivocada da matéria corresponente, que trata de compulsão sexual. Caindo na vala comum do uso do corpo feminino para chamar a atenção de leitores - de forma tão desprezível quanto o fazem as campanhas publicitárias das cervejas brasileiras -, a mensagem da capa não traduz a riqueza do texto que trata do tema, pois dá a entender que a matéria abordará, apenas, a compulsão sexual feminina (como se essa fosse a única expressão do problema), quando, na realidade, estão em foco todas as dimensões da compulsão sexual, seja ela hetero ou homessexual. Gostei muito do texto, mas a escolha da capa foi imperdoável.
Outra matéria, assinada por uma psicanalista, é intitulada "A mulher moderna e seu dinheiro". Fazendo uma abordagem a partir da noção de pós-modernidade, amparada em Gilles Lipovetsky, o texto trata das conquistas femininas relacionadas à independência financeira como fruto do que chama de "revolução feminina", mas faz uma associação esdrúxula do ganho financeiro das mulheres com a prostituição, já que o dinheiro é um elemento do âmbito público, supostamente conquistado pelas mulheres através da prostituição. Abre aspas: "Mulher + Dinheiro + Âmbito Público = Prostituição". Fecha aspas. Conclusão da autora: A definição atual de mulher ainda insiste no fato de que mulher pública é sinônimo de prostituta. É o que chama de "fantasma da prostituição". Pelo amor de Deus!!! Com que base empírica ela foi fazer uma inferência dessa natureza? Hoje, no Brasil, 60% das mulheres são chefes de família, ou sejam, são as provedoras da vida doméstica e, em sua maioria, não contam com a presença masculina. Embora em alguns segmentos ainda haja disparidade entre os salários de mulheres e homens que desempenham a mesma função - o que legitima lutas pela igualdade de gênero em todo o mundo -, a mulher que trabalha, seja em emprego formal ou na informalidade, orgulha-se muito da sua independência financeira, que representa, em certa medida, a conquista da dependência emocional na relação afetiva, estreitamente ligada à condição do macho provedor. No ano passado, paguei a disciplina Métodos Quantitativos - Estatística, no Doutorado, na UFPE. O trabalho final solicitado era uma pesquisa de campo que aplicasse os métodos estudados. A equipe que participei resolveu tratar do trabalho informal nos arredores do campus da UFPE, no bairro Cidade Universitária, em Recife. Fizemos formulários e os aplicamos aos vendedores de comida, artesanato, livros usados, além de prestadores de serviços como conserto de celular, flanelinhas, etc. Foi umas das experiências mais ricas pelas quais já passei, em termos de pesquisa. Dividida a equipe por áreas, saí sozinha em busca dos meus entrevistados. Imaginava que as respostas aos quesitos do formulário seriam objetivas e sem profundidade, mas descobri uma grande necessidade de fala entre eles. Muitas das conversas demoraram mais de uma hora (foram várias tardes de trabalho). A maioria dos trabalhadores da informalidade são mulheres e algumas das entrevistadas chegaram às lágrimas ao tratar da importância daquela atividade informal para a sua vida pessoal, já que representa autonomia e independência. Não vi, entre as entrevistadas, qualquer sinal de culpa pelo trabalho ou, muito menos, pelo dinheiro ganho com sua atividade profissional. Saí dali com outro olhar sobre os vendedores e as vendedoras ambulantes e demais trabalhadores informais. Aquela pesquisa foi suficiente para que o sofrimento vivenciado na disciplina Estatística valesse a pena. A autora do texto em questão deveria ir a campo para ver de perto o tamanho do equívoco que ela cometeu ao tratar do "fantasma da prostituição".
Mas a matéria mais interessante é assinada pela jornalista Lúcia Rocha, de Maceió. Com o título "Limites: onde encontrá-los?", o texto aborda, com amparo na Psicanálise, como estabelecer os limites nas crianças, de modo a firmar inscrições subjetivas aptas a indicar o certo e o errado, o bom e o ruim, o bem e o mal. Contribuem para a matéria as psicanalistas alagoanas Taciana Mafra e Heliane Leitão, o psicanalista mineiro Messias Eustáquio Chaves e a socióloga Ruth Vasconcelos. A matéria aborda a lógica do sim e do não, a relação entre os pais, o bebê e a ética, a falha na escuta dos filhos, a questão da suposta culpa dos pais, os efeitos da ausência de limites e a relação entre a crise na família e a violência social. Em destaque, também, a relação entre adolescência e transgressões, a dor de viver diante das frustrações e o que ainda pode ser feito pelos jovens em conflito com a lei subjetiva. É uma leitura indispensável, que faz valer toda a revista.

quinta-feira, 28 de agosto de 2008

Antanas Mockus


Hoje à tarde a UFAL recebeu o Prof. Antanas Mockus, ex-prefeito de Bogotá, que veio a Maceió para colaborar com o Governo do Estado nas ações de combate ao crime e à violência. A reunião controu com as presenças da Reitora Ana Dayse, do Vice-Reitor Eurico, de alguns dos Diretores de Centros e demais professores interessados na temática. Nós, do NEVIAL, também estávamos lá, unindo forças para colaborar através de nossas pesquisas e estudos, sempre voltados para a questão da violência. A apresentação de Antanas Mockus envolveu uma concepção de cidadania que parte da valorização da vida humana, fundamental para qualquer atividade que se proponha a reduzir os índices de homicídio. Esse, aliás, é o objetivo inicial do Plano de Paz que se busca implantar em Maceió, que já conta com um número de homicídios/mês maior do que na Faixa de Gaza. Lamentavelmente, são muitas vidas perdidas a cada dia, sendo em sua maioria jovens das classes economicamente mais pobres. É claro que isso já começa a bater na porta da classe média, mas não com a contundência com a qual atinge as populações dos bairros pobres. A desvalorização da vida e a banalização da morte - expressões da Professora Ruth Vasconcelos - reconfiguram a forma como a violência se manifesta, de modo a tornar muito delicada a abordagem ao problema, já que as pessoas não mais se chocam com a morte violenta de um jovem. A proposta de Mockus não se concentra na punição, no recrudescimento da legislação ou em respostas violentas. Ao contrário, busca encontrar na própria sociedade os sentimentos que norteiam a idéia de uma vida pacífica e harmoniosa, pautada pelo respeito aos outros e pela valorização da cultura local, como no caso do Bumba-meu-boi, elemento típico do folclore alagoano, que poderá ser utilizado como um instrumento para a valorização dos sujeitos. A longa reunião rendeu bons frutos, sobretudo porque muitos dos professores presentes demonstraram o interesse pelo tema, tratado direta ou indiretamente em suas pesquisas, desde a área de saúde, até no campo das ciências exatas, que podem contribuir, principalemente, na formação de um banco de dados sólido para nortear as ações do Estado e da sociedade civil. O NEVIAL está aí, atento a tudo isso. Sinto que há algo diferente no ar... Nunca a questão da segurança pública em Alagoas foi tratada nesses termos: cidadania, cultura, revalorização da vida. Espero poder ver concretizados as idéias há tanto tempo debatidas pelos cientistas sociais.

terça-feira, 26 de agosto de 2008

A complexidade da violência



Hoje pela manhã participei de uma Jornada de Psicologia, que teve como tema a violência. O evento aconteceu no Hospital Psiquiátrico Portugal Ramalho, único hospital público de Alagoas que, além de tratar pessoas com doenças mentais, oferece tratamento para dependentes químicos. Tive o prazer de dividir a mesa com a psicóloga Lenise Cajueiro, que trouxe o olhar da Psicologia sobre a violência. Minha abordagem foi sociológica e busquei enfatizar a complexidade do fenômeno da violência, que não pode ser abordado unilateralmente - apenas no viés subjetivo, social ou jurídico. Para ser compreendida, a violência precisa ser pensada numa base interdisciplinar, sem ignorar, inclusive, a dimensão econômica da coisa, que desemboca numa questão de gestão e administração pública. A violência contemporânea é dotada de grande ambiguidade, pois ao mesmo tempo em que ameaça a convivência pública e democrática, torna-se elemento estruturador e constitutivo do tecido social, influenciando novas formas de articulação da sociedade civil. Não quero dizer, com isso, que a violência tem um "lado bom", mas é preciso reconhecer que mesmo as situações adversas da convivência humana podem tornar-se elementos de rearticulação social e cultural. Nas periferias, por exemplo, além das associações de bairros, expressões artísticas como o rap e o funk encontram na violência o motivo para essa articulação. Com isso, a vida social é reescrita e novas configurações de sociabilidade são estabelecidas. É nesse sentido que a violência se torna estruturante. Essa reflexão, porém, passa ao largo daquilo que vivenciam as vítimas de violência, sobretudo nas grandes cidades, permeadas por uma atmosfera de terror e pânico capaz de modificar o modo de vida das pessoas (ver charge acima). Por outro lado, além da violência física, é preciso pensar em outras expressões da violência, como a de ordem psicológica (moral e material) e a de natureza simbólica (de gênero, raça e classe). Emfim, como fenômeno dinâmico, a violência proporciona um debate inesgotável e fundamental para que se possa pensar em soluções para uma vida social mais feliz, à la Platão.

domingo, 24 de agosto de 2008

Na natureza selvagem


Quando li a sinopse do filme Na natureza selvagem, dirigido por Sean Penn, não sabia que a narrativa era muito mais intensa do que aquilo que se apresentava no texto. O filme conta a aventura de Alex, filho de uma tradicional família americana de classe média, rumo a uma vida errante e solitária, que tem como destino final o Alasca. Mais do que o relato de alguém que abandona a vida de conforto para viver solto no mundo, a história de Alex representa o mergulho em uma introspecção que supostamente o levaria à felicidade. Não, não vou estragar o prazer dos meus queridos leitores e contar o final do filme, mas deixo registrada aqui uma das frases mais fortes do filme: "A felicidade só é real quando compartilhada". A grande surpresa do filme? Saber que foi baseado em fatos reais. Eu ia bem, segurando as lágrimas (logo eu, uma chorona assumida), até o final dramático da história, mas ver a foto do verdadeiro Alex foi demais para mim. Um filme muito bonito, mas que requer bom fôlego. Recomendo!

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Ó, Maceió, você roubou meu coração!


Hoje é o dia do Folclore. Na cidade de Maceió, diversas manifestações lembram a data. No supermercado, vejo uma criança vestida em farda escolar, usando com muito orgulho uma coroa de Guerreiro, com a igreja e suas pedrarias. Olho para ele e não consigo disfarçar um sorriso de admiração. Minha geração não valorizou o folclore alagoano como deveria. Pelo que vejo, com as novas gerações isso será diferente. Que bom! Deixo aqui apenas uma singela homenagem à minha cidade, tão querida: uma foto que fiz da Praia de Ponta Verde. Sim, as cores são originalíssimas. Esse é o mar de Maceió! O título do post é um trecho de uma música que se tornou verdadeiro hino de Maceió. A composição é de Carlos Moura e a interpretação mais conhecida é de Eliezer Setton.
Ponta de Lápis.
Ponta de lápis, escrevo meu amor à vista
Viajei de mar acima , te encontrei em Maceió
Minha sereia, Ponta Verde, Pajuçara, o seus braços embalam saudade de Maceió
M de mar,
A de amor
C de carinho, sol e mar de Maceió
E de eterno
I de ilusão
Ó Maceió, você roubou meu coração
Ai que saudades do céu, do sal, do sol de Maceió (4 X)

Trio Augur, da Alemanha

Ontem à noite o Trio Augur, da Alemanha, fez uma bela apresentação de música clássica no Teatro de Arena. O pequeno teatro, com capacidade para 180 pessoas, ficou lotado e nem mesmo o forte calor resultante de um ar condicionado quebrado foi suficiente para minimizar o prazer da platéia, maravilhada com as peças ali apresentadas. Apresento algumas informações sobre o Trio, colhidas no Portal do CEFET:


Kyoko Kanazawa, nascida em Tokyo e radicada na Alemanha, é professora de piano Conservatório de Música no Würzburg. Foi premiada no concurso da Academia de Música daquela cidade e realizou várias turnês pela Alemanha e em outros países. Estudou piano e música de câmera na Academia de Música Muashino em Tokyo. Participou de Masterclasses nos Conservatórios de Música de Salzburg e Würzburg com os professores Arne Torger e Hans Leygraf.

Berthold Guggenberger, amigo do Coretfal há mais de uma década, nasceu em Augsburg /Alemanha. Estudou com os professores Georg Baynov, Kolja Lessing, Konrad von der Goltz, Ladislau Kiss e Herwig Zack. Tem cursos de aperfeicoamento (Masterclasses) com os professores Victor Pikeisen, Yehudi Menuhin, Henry W. Meyer, William Pleeth e Mstislav Rostropowitsch. Participou de eventos internacionais de música, entre eles, o Festival de Música de Schleswig-Holstein e Academia de Música Internacional de Pommersfelden, além de turnês apresentando concertos na Alemanha e em outros países do continente Europeu e América do Sul, incluindo o Brasil. É membro da Orchestra Synfonica de Hof, Orchestra Synfonica das Nações e Orchestra Filarmônica de Koblenz, professor de violino e viola e spalla (primeiro violino) da Orquestra de Giengen.

O violoncelista e contrabaixista Roman Guggenberger, irmão de Berthold, estudou com os professores Peter Buck (Melos Quartett), Carine Georgian e Mikel Flaksman. Fez cursos de aperfeiçoamento com os professores Paul Szabo (Vegh Quartett) William Pleeth e Henry W. Meyer (La Salle Quartett). Realizou várias turnês na Alemanha e em outros paises com a Filarmônica Alemã dos Jovens, o Conjunto de Câmera do Grupo M e o Conjunto de Colonia. É professor de violoncelo e integrante da Orquestra de Giengen.


Além desses músicos, participaram da apresentação a violoncelista Ruth Gretzmeier, o contrabaixista Diogo de Amorim e os alunos do Curso de Canto da UFAL Myrna Araújo, Larissa Melo e Bruno Sandes. A apresentação foi um dos raros momentos em que a música clássica é divulgada em Alagoas. Curioso notar que o público se repete: são sempre as mesmas pessoas que freqüentam esses eventos. Isso me fez pensar que há um público fiel, ávido por oportunidades como essa. Voltei para casa com aquelas belas melodias ecoando em meus ouvidos.

quarta-feira, 20 de agosto de 2008

Propaganda eleitoral gratuita

Ontem começou a propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV. Como já esperava (lamentavelmente), tudo muito caricatural. Gostaria de estar enganada, mas aqueles são, de fato, os nossos candidatos. Para a Prefeitura, penso que o debate é equilibrado, sem grandes implicações para a ordem pública, mas para a Vereança... A sensação que tenho, quando assito a tais programas, é que se trata de ficção. Ainda não sei em quem vou votar (e quando souber, não vou manifestar aqui, já que o voto é secreto e isso é uma das garantias do processo democrático), mas sei, com toda a certeza, em quem NÃO votarei. Ouvi algumas pessoas afirmando que as eleições 2008 estão "mornas", já que a legislação estabeleceu uma série de limitações à propaganda eleitoral, com o propósito de higienizar todo o processo, salvaguardando a limpeza das ruas, dos muros e dos postes e reduzindo a poluição sonora. Eleição já não se ganha mais no grito, nem tampouco com belas fotos dos candidatos e panfletagem exaustiva. Gostaria de poder dizer que eleição se ganha através de propostas sólidas e fundamentadas, mas também não posso fazer essa afirmação, sobretudo porque, como cidadã alagoana, conheço bem a dinâmica da coisa: compra-e-venda de votos, ameaças à integridade física dos candidatos de oposição, assaltos a bancos e estabelecimentos comerciais durante os meses de campanha eleitoral. Não sou tão naive assim, mas ainda tenho esperanças de vivenciar um processo eleitoral verdadeiramente democrático. Enquanto isso, divirto-me com a propaganda eleitoral da TV: rindo para não chorar.

segunda-feira, 18 de agosto de 2008

Para compreender a violência em Alagoas






A violência em Alagoas é um fenômeno complexo, sobretudo porque une elementos da cultura coronelista e patriarcal que marcam a história deste Estado tipicamente canavieiro, com aspectos contemporâneos do desenvolvimento desordenado dos centros urbanos. Assim, as diversas expressões da criminalidade e da violência - violência política, violência urbana, violência doméstica, por exemplo - exigem tratamentos metodológicos distintos, de acordo com a esfera a ser pesquisada. Os interessados na temática da criminalidade e da violência não podem compreender esses fenômenos sem um olhar mais amplo sobre a história e a cultura alagoana, bastante explorada pelos pesquisadores locais das Ciências Sociais, da História e da Economia. Nesse sentido, as publicações da Editora da Universidade Federal de Alagoas (Edufal) têm contrubuído para a produção de conhecimento local nas mais diversas áreas do saber. Especificamente sobre o tema da violência e da criminalidade, os livros da Professora Ruth Vasconcelos tornaram-se fundamentais para qualquer pesquisador ou curioso sobre a dinâmica desses fenômenos. Em O poder e a cultura de violência em Alagoas, a socióloga analisa como a formação de uma cultura de violência está estreitamente ligada às relações de poder que se estabelecem historicamente no cenário político alagoano. Através da Teoria das Representações Sociais, analisa as manchetes dos principais jornais alagoanos, justamente no momento histórico em que começa a ser desmascarada a chamada "gangue fardada", formada por membros das polícias militar e civil. Já em O reverso da moeda: a rede de movimentos sociais contra a violência em Alagoas, a Professora Ruth analisa os avanços e as limitações dos movimentos sociais no combate à violência - sobretudo àquela relacionadas às redes de poder. São dois livros fundamentais e extremamente interessantes, que resultaram da tese de Doutoramento da socióloga Ruth Vasconcelos pela UFPE. Tive o privilégio de acompanhar o nascimento desses dois livros, publicados no momento em que a Professora Ruth me orientava no Mestrado em Sociologia. Hoje, como membro do NEVIAL, compartilho do conhecimento e da amizade de uma das maiores pesquisadoras da UFAL. Sou realmente privilegiada!

NEVIAL

O NEVIAL é o Núcleo de Estudos sobre a Violência em Alagoas, criado pela Socióloga Ruth Vasconcelos, professora do curso de graduação em Ciências Sociais e do Mestrado em Sociologia da Universidade Federal de Alagoas. Contando com a participação de professores e alunos de outros cursos da UFAL, como Direito e Filosofia, e de pesquisadores de outros centros de estudos, o NEVIAL abriu um importante espaço de debates e pesquisas voltadas para a compreensão da realidade da violência no Estado de Alagoas, a partir de várias linhas de pesquisa. Durante o Congresso Nacional de Segurança Pública (CONNASP), que ocorreu em Maceió no mês de maio passado, o NEVIAL participu ativamente, em mesas redondas e grupos de trabalho, o que proporcionou a aproximação de seus componentes, agora mais articulados para levar adiante os objetivos do Núcleo. Com o apoio da Reitora Ana Dayse, o NEVIAL em breve terá uma página na internet, fundamental para dar publicidade às atividades desenvolvidas. Aguardem mais notícias do NEVIAL!

sábado, 16 de agosto de 2008

Feminismo em Portugal


A grande surpresa de minha viagem a Portugal foi tomar conhecimento de que, naquela semana, estava acontecendo o II Congresso Feminista de Portugal, na Fundação Calouste Gulbenkian, que fica na mesma avenida onde se localiza a Universidade Nova de Lisboa. Sem titubear, inscrevi-me no evento e pude assistir algumas conferências e palestras. Como pesquisadora da área de gênero, o evento caía como uma luva para mim. O detalhe que encheu aquela situação inusitada de encanto foi o fato de que o espaço da Fundação, com salas de conferência, livraria, mostras de artes plásticas e restaurantes, é rodeado por bosques com árvores polinizadas, que exalavam um perfume maravilhoso. Dentro dessa atmosfera bucólica, procurei, na programação do evento, temas que me interessavam, já que havia conferências simultâneas. Assisti, então, a uma mesa redonda cujo tema era a prostituição e o tráfico internacional de mulheres. Dentre as palestrantes, uma professora brasleira, da UnB. O debate foi acirrado, sobretudo porque não é fácil chegar a um consenso acerca da prostituição feminina. Enquanto algumas defendiam a atividade como um direito da mulher, outras enfatizavam a indignidade da venda do corpo, principalmente quando isso aparece como único meio de sobrevivência. Dentre as informações compartilhadas, a que mais me deixou triste, embora não surpresa, foi a de que o tráfico de mulheres para fins de prostituição na Europa é basicamente formado por brasileiras, aliciadas com promessas de altos salários em euros. Saí dali encantada com o nível da discussão e cheia de idéias na cabeça. Mal sabia que o mais interessante ainda me aguardava... No maior de todos os auditórios iria acontecer uma mesa redonda formada por 10 das principais feministas de Portugal (foto ao lado), de várias gerações, muitas delas contemporâneas de Sinome de Beauvoir, a primeira grande intelectual dedicada à questão feminina. Antes do maravilhoso debate que ali ocorreu, houve um pequeno concerto de música clássica, com dois violinistas e uma pianista. Foi a preparação para o que viria logo depois: uma mostra de fotos das feministas européias de todos os tempos, com especial destaque às portuguesas. As fotos foram apresentadas no mais absoluto silêncio, que concedeu àquele momento um tom de respeito e reverência às mulheres que romperam o paradigma da política masculina dominante e inauguraram as diversas frentes de luta pela igualdade e pela dignidade feminina. A cada nova foto, uma salva de palmas, sobretudo quando se tratava de fotos antigas de algumas das feministas ali presentes. Foi um momento especial e inesquecível. Senti-me muito próxima àquelas mulheres, mesmo estando ali sozinha, em meio a dezenas de desconhecidas. É que a questão feminina, embora permeada por variáveis culturais, é marcada pela universalidade da dimensão sexuada da vida humana. Impossível fechar os olhos para isso.


Intercâmbio acadêmico em Portugal

No mês de junho que passou participei do VI Congresso da Associação Portuguesa de Sociologia, em Lisboa. O meu propósito era apresentar dois trabalhos em Sessões Coordenadas que discutiam temas relacionados a gênero e criminalidade. Um deles tratava da relação entre a Criminologia e o Feminismo, enfatizando a necessidade de um casamento entre esses dois campos do saber. O outro fazia uma síntese da minha pesquisa de Mestrado, que analisou como o afeto pode influenciar mulheres em práticas criminosas relacionadas ao tráfico de drogas. O evento ocorreu na Universidade Nova de Lisboa. Apresentei meus trabalhos com tranqüilidade, mesmo diante da birra do meu pen drive voluntarioso, que resolveu não abrir na segunda apresentação. Como o pesquisador conhece seus textos como a palma de sua mão, não foi difícil contornar a situação e expor o trabalho apenas oralmente. Afinal, esses artifícios metodológicos de apresentação oral devem sempre atuar como coadjuvantes da pesquisa. O protagonista é o trabalho em si, seus presuspostos e o método de comprovação dos resultados. Não esperava tantos questionamentos depois das apresentações, mas isso foi uma agradável surpresa, sobretudo porque troquei idéias com pesquisadores portugueses que têm interesses acadêmicos muito próximos dos meus. Como o cenário do crime e da violência em Portugal não se compara com o que vivenciamos no Brasil, a produção acadêmica brasileira acaba por ser mais ampla e complexa. Pelo que pude perceber, as pesquisas lusitanas nessa área concentram-se na questão da violência doméstica, especialmente contra as mulheres. São pesquisas de natureza mista - qualitativas e quantitativas - que partem dos números e das correlações entre variáveis para chegar à dimensão subjetiva. Comprei alguns livros que resultaram dessas pesquisas. O intercâmbio acadêmico foi uma experiência que muito me marcou. Eu já sabia que a ciência não tinha fronteiras, mas ali pude vivenciar isso de uma maneira muito especial.

sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Não é do Fagner...

Já que falei em Florbela Espanca, deixo aqui um dos poemas mais conhecidos da poetisa portuguesa: Fanatismo. Os mais desavisados pensam que é de autoria do Fagner, que o interpreta divinamente. Equívoco recorrente e perdoável.
Minh'alma, de sonhar-te, anda perdida
Meus olhos andam cegos de te ver
Não és sequer razão de meu viver
Pois que tu és já toda a minha vida
Não vejo nada assim enlouquecida
Passo no mundo, meu Amor, a ler
No misterioso livro do teu ser
A mesma história tantas vezes lida
Tudo no mundo é frágil, tudo passa
Quando me dizem isto, toda a graça
Duma boca divina fala em mim
E, olhos postos em ti, vivo de rastros
Ah! Podem voar mundos, morrer astros
Que tu és como Deus: princípio e fim
Simplesmente lindo!

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

A arte de escrever




Depois de uma pausa involuntária, mas necessária, estou de volta, cheia de idéias para os meus posts diários. Escrever todos os dias é um desafio, ainda que não sejam textos complexos ou muito extensos. Penso que escrever por obrigação é algo muito chato e imagino a pressão que recai sobre jornalistas e colunistas de publicações diárias, obrigados a criar bons textos todos os dias, mesmo quando a inspiração não está por perto. Por outro lado, talvez seja esse mesmo o "tempero da coisa" para esses profissionais: matar um leão diariamente. Como escrever para um blog não é a mesma coisa que escrever para um jornal, não me sinto pressionada. Pelo contrário, é sempre um prazer parar um pouco e rabiscar umas linhas sobre algo que me interessa. Tenho muitos textos escritos, sobre temas diversos. Além dos trabalhos acadêmicos, pautados pelos rigores metodológicos necessários para a cientificidade dos artigos (e esses normalmente são publicados em revistas acadêmicas indexadas), guardo em meus arquivos outros textos que escrevi sem qualquer propósito de publicação. São textos para mim mesma, nos quais tento colocar no lugar algumas idéias que vêm e vão em insights esporádicos. Os temas? Os mais variados, sobre a vida e o mundo. Também já tentei escrever poesias, mas é uma coisa que não dá certo. É que a poesia tem sempre uma carga emocional muito intensa (a depender do tema, claro), que me impede de escrever por escrever. Aliás, quero crer que os poetas escrevem o que realmente sentem. Seria terrível pensar que Florbela Espanca, por exemplo, não sentia de fato aquilo que falava em seus poemas. Impossível: sua biografia revela uma relação direta de seus escritos com o que vivia. Mas sei que nem sempre é assim. Seja como for, o texto sempre revela um pouco de quem o escreve e, assim, imortaliza seu autor.

domingo, 3 de agosto de 2008

Sobre âncoras e espelhos d´água

Um dos melhores blogs que já visitei (e que visito constantemente) é o do Prof. Pablo Falcão, da ASCES, de Caruaru. Doutorando em Direito pela UFPE, o Prof. Pablo vem aprofundando seus estudos sobre bioética através das teorias filosóficas da linguagem. Além de debates teóricos, o blog apresenta dicas para os cinéfilos e amantes do bom rock'n roll, já que Pablo também faz parte de uma banda que em breve lançará o seu primeiro CD. Tudo bem que sou uma prima coruja, mas o blog é bom mesmo! Até o título é instigante, inpirado na linha metafórica dos pós-modernos (sobretudo Boaventura de Souza Santos): "Sobre âncoras e espelhos d´água". Quem visitar o blog não vai se arrepender.

Imperdível!


O filme francês "A culpa é do Fidel" entrou para o rol dos meus preferidos. O comunismo é mostrado com um toque de humor e, o que é melhor, sob a ótica de uma criança que não compreende bem o que se passa com sua família. É muito interessante ver a sutileza com que são tratadas as diferentes leituras da realidade e da vida em sociedade, da acumulação de capital e da distribuição de riquezas. Para mim, uma das cenas mais engraçadas é aquela em que os amigos "vermelhos e barbados" do pai de Anna tentam mostrar para a pequena capitalista reacionária um outro olhar sobre a vida. Um filme muito sensível, que vale a pena conferir.

sábado, 2 de agosto de 2008

A saga de Lampião


O programa Terra e Mar, da TV Gazeta, mostrou hoje um pouco da história do Cangaço, com especial ênfase à figura de Lampião e seu bando. O Cangaço é anterior a Lampião, mas somente com ele passa ter a face que hoje conhecemos. Entre herói e bandido, Virgulino Ferreira (Lampião) tornou-se uma figura quase folclórica, que inspira artesãos, artistas plásticos, repentistas e compositores. Assim também sua companheira, Maria Bonita, mulher forte e guerreira, além de outros cangaceiros, como Corisco e Dadá. Cresci ouvindo histórias sobre o bando de Lampião e suas andanças pelo interior do Estado de Alagoas. Sua fama de sanguinário corria todo o Nordeste, criando uma atmosfera de medo e angústia. Se aparecia um boato de que o tal bando estava por perto, as pessoas se trancavam em suas casas, apagavam todas as luzes, faziam silêncio absoluto. Algumas viagens ao município de Piranhas, em Alagoas, acentuaram o meu interesse pelo tema, sobretudo porque pude visitar um museu onde estão expostos objetos do Cangaço, bem como a Gruta de Angicos, onde aconteceu a chacina que vitimou Lampião, Maria Bonita e outros cangaceiros. O mais curioso são as histórias contadas pelos guias locais, cuja veracidade não posso atestar. Maria Bonita, por exemplo, seria casada com um alfaiate. Apaixonou-se por Lampião, largou o marido e uniu-se ao chefe do Cangaço, tornando-se a mais famosa cangaceira da história. Lampião, por sua vez, era muito vaidoso: usava perfumes caros, tomava uísque, gostava de jóias (ouro e pedras preciosas) e fazia de suas roupas de couro verdadeiras obras de arte. Não foi à toa que permitiu ser filmado pelo mascate libanês Benjamin Abrahão, como podemos ver no filme Baile Perfumado, que apresenta cenas reais de Lampião e seu bando. Outro fato que muito me surpreendeu foi saber que as cabeças dos cangaceiros assassinados (expostas na escadaria da Prefeitura de Piranhas) foram levadas para Salvador, na Bahia, com o propósito de serem submetidas a exames criminológicos. O que se queria era averiguar se a anatomia daqueles crânios estava em conformidade com o que descrevia Lombroso, em L'Uomo Delinquente, acerca do criminoso nato e atávico. Como estudiosa da Criminologia, não pude deixar de achar aquilo extremamente interessante. Por outro lado, ao visitar o santuáro do Pe. Cícero, em Juazeiro do Norte, no Ceará, fiquei sabendo que Pe. Cícero (outro personagem controvertido da história do Nordeste) era padrinho de Crisma de Lampião e isso tinha implicações políticas para a época. Isso sem falar que, no caminho para Juazeiro do Norte, paramos para almoçar em Serra Talhada e descobrimos, ao consultarmos nosso guia de viagens, que aquela era a cidade onde havia nascido Lampião. Tentamos visitar a casa dele, mas não estava aberta para visitação. Um bom motivo para voltar ali, pensei. Não pude deixar de refletir sobre a forte presença da saga de Lampião em grande parte do Nordeste (principalmente entre os Estados de Alagoas, Sergipe, Pernambuco e Bahia). Lamento, apenas, não ter tempo de ler mais sobre o tema.

sexta-feira, 1 de agosto de 2008

E por falar em saudade...


Dizem que saudade é uma palavra que só existe em português. Não sei se é verdade, mas isso não faz a mínima diferença. Seja em que idioma for, a saudade é um importante elemento de conexão na vida humana. Conecta-nos com o que fomos, com o que deixamos de ser, ou mesmo com o que não fomos e que jamais poderemos ser. Sartreano demais? Talvez. O saudosismo, por sua vez, povoa músicas, poemas e romances. Implica em olhar para trás e ver que valeu a pena o esforço dentro de um movimento político (já que se acreditava, de fato, que é possível mudar o mundo), valeu a pena ajudar alguém que precisava e que hoje é uma pessoa feliz, valeu a pena viver um grande amor, mesmo que não tenha sido amor para toda a vida. Sempre gostei de conversar com os mais velhos e ouvir sobre suas lembranças. Gosto de histórias de vida (uso isso como artifício metodológico em minhas pesquisas sociológicas) e viajo nas narrativas do passado. Talvez por isso, o livro "Chrônicas Alagoanas: lembranças das matas e agrestados de Alagoas", de autoria do Professor Luiz Sávio de Almeida, tenha me marcado tanto. É um dos melhores livros que já li. Não se trata de uma autobiografia, mas mistura elementos da interessante vida do Professor Sávio, vivida nas cidades alagoanas de Viçosa, Capela, Arapiraca e Maceió, com momentos históricos e questões políticas. Assim, a história de Alagoas se faz viva através do olhar do autor. É impossível não se familiarizar com algumas situações narradas e não dar boas risadas com a maneira descontraída como ele descreve, por exemplo, a forma severa de educar as crianças há algumas décadas atrás, o preparo das deliciosas comidas interioranas (da Mamãe, da Vovó, da Titia), ou mesmo a comoção e os rituais que envolvem a morte e o sepultamento de um ente querido. Sempre que encontro o Professor Sávio, puxo alguma coisa do baú desse belo livro e ganho de presente mais algumas narrativas e detalhes dos bastidores. Um verdadeiro privilégio. A sensação que tive, ao ler o livro, foi de reviver algo que não vivi. Senti saudades daquele tempo.

Voltei, Recife

Mais uma vez pego a AL 101 Norte, rumo à Recife. Minha querida prima Neidoca está comigo e conversamos amenidades. Viagem tranqüila, alguns buracos (nada comparado à BR 316), paisagem belíssima, sobretudo entre as cidades de Japaratinga, Maragogi e São José da Coroa Grande. As constantes chuvas dos meses de junho e julho deixaram o verde mais verde e em meio aos gigantescos tapetes de cana-de-açúcar, surge a Reserva Ecológica de Saltinho. Reduzo a velocidade do carro e abro os vidros: quero sentir o cheiro e ouvir os sons da Mata Atlântica. Passados alguns quilômetros, cana-de-açúcar novamente. Em Recife, engarrafamento em Piedade (já esperava por isso). A companhia de Laura Pausini, Ney Matogrosso (cantando Cartola!) e Flávio Venturini ajuda a minimizar a impaciência. Resolvi dar férias ao Oswaldo Montenegro, já afônico de tanto cantar para mim. Ao estacionar o carro, Chiquitita me recebe com muito carinho. Já me esperava na garagem. Falo para ela da homenagem no blog, ela solta um miado de satisfação (penso eu...) e me segue em seu silêncio psicanalítico. Em casa, alegria pela minha presença. Vou para a UFPE, resolvo questões burocráticas, participo de reuniões e revejo amigos queridos. No alto do 12º andar do Centro de Filosofia e Ciências Humanas, paro diante dos janelões, observo o pôr-do-sol e aquela paisagem tão familiar. Saudade.

quarta-feira, 30 de julho de 2008

Maioridade do ECA

No dia 13 de julho o Estatuto da Criança e do Adolescente, conhecido como ECA, completou 18 anos de existência. A maioridade do ECA nos impulsiona a refletir sobre os avanços vivenciados na área da proteção da infância e da juventude no Brasil. Primeiro, é preciso reconhecer que o ECA teve o condão de modificar o tratamento dado a crianças e adolescentes, sobretudo porque ampliou a esfera de atuação preventiva e protecionista do Estado e da sociedade civil. Conseqüência direta da redemocratização proporcionada pela Constituição Federal de 1988, o ECA revogou o antigo Código de Menores, rompendo, assim, com o autoritarismo típico dos períodos ditatoriais vivenciados pelo Brasil. Foi considerado, então, uma lei progressista, que tornou possível a instituição de uma cultura de proteção integral à criança e ao adolescente, já instituída pela Constituição. Mesmo com muita resistência dos setores conservadores do cenário político e da sociedade civil brasileira, o ECA foi responsável por diversos avanços, tanto em aspectos processuais, quanto materiais. Processualmente, passa-se a utilizar os princípios constitucionais básicos, como o devido processo legal, a ampla defesa e o contraditório, na defesa de crianças e adolescentes autores de atos infracionais. Com isso, minimizam-se as possibilidades de adoção de medidas arbitrárias, tão comuns durante a vigência do Código de Menores. Materialmente, estabelecem-se medidas de proteção, com o propósito de garantir o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários. Assim, o ECA impôs o reconhecimento de crianças e adolescentes como sujeitos de direitos. No entanto, há, ainda, um grande fosso entre a previsão legal e a realidade dos fatos, no Brasil. Estamos longe de uma condição satisfatória de acesso ao mínimo básico para uma vida digna e um futuro promissor para crianças e adolescentes pobres e marginalizados. Além disso, também toleramos situações absurdas como o trabalho infantil, a exploração sexual e a atuação de grupos de extermínio. O problema é que, se houve avanços no sistema legal, ainda não os alcançamos nas ruas, nos bairros e nas comunidades. Mais uma vez, amparo-me nas lições do saudoso Norberto Bobbio, em A Era dos Direitos: “O problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas político”. O nosso desafio, portanto, é fazer do ECA uma realidade no cotidiano de crianças e adolescentes brasileiros.
Publicado na Gazeta de Alagoas, em 17/07/2008.

Um tributo a Chiquitita



Não, não se trata de um tributo àquela novela mexicana que fez sucesso entre a criançada nos anos 90. Minha homenagem aqui é à Chiquitita, grande companheira durante um ano de solidão (e aqui fica a minha saudação a Gabriel Garcia Marquez), quando pagava créditos do doutorado, em Recife. Chiquitita é a gata da minha Tia Biuzinha, em destaque na foto ao lado (a gata, não a Tia). Pensei em escrever sobre ela depois que finalizei o post anterior, que trata da solidão acadêmica. Afinal, Chiquitita estava sempre comigo nas horas de estudo em casa. Às vezes ela subia nas apostilas e eu podia jurar que estava interessada em Talcott Parsons, Michel Foucault ou Pierre Bourdieu. Essa gata é praticamente uma socióloga, pensava eu. Certo dia, ao chegar em casa em companhia de uma terrível dor de cabeça, adormeci e esqueci de fechar a porta. Sim, porque Chiquitita tem pouca noção de limite: invade todos os ambientes. Sabe aquelas sensações que não se explicam? Senti uma "presença" e abri os olhos. Que susto! A gata estava cheirando o meu rosto. Dei um grito tão grande, que ela pulou longe. Aí comecei a brigar com ela, como se fosse gente. Um verdadeiro sermão. Só depois que o coração desacelerou um pouco é que pude me dar conta de que não haveria interlocução ali, já que dentro de casa estávamos somente eu e a gata. Eu tentava mostrar para ela, com palavras, que não se dá susto em ninguém. Hoje tenho certeza de que ela não assimilou nada do que falei. Mas, como acredito na cura pela fala, penso que aquilo tudo foi o remédio adequado para curar, pelo menos, a minha dor de cabeça. Com o susto, esqueci da enxaqueca. E Chiquitita continua nonsense.

terça-feira, 29 de julho de 2008

Vicissitudes da vida acadêmica

Toda profissão tem seus encantos e peculiaridades. A opção pela vida acadêmica, em particular, leva ao mergulho em um mundo muito interessante, de debates e diálogos, de enfrentamentos e exposições. Em outras palavras, é um constante "dar a cara a tapas". Nesse universo é possível conhecer as chamadas "variações sobre o mesmo tema" (isso me lembra uma música dos Engenheiros do Hawaii...), ou seja, perceber que há olhares distintos sobre o mesmo objeto. Aqui se encaixa a metáfora da "perspectiva", conceito tão presente entre os arquitetos e os desenhistas. O meu ponto de vista não tem que ser (e nem pode ser) absolutamente igual ao seu. E isso torna a vida muito mais interessante. Por outro lado, a possibilidade de diálogo com outras áreas do conhecimento permite uma compreensão global daquilo que se estuda. Ciências sociais, humanas e exatas se entrelaçam constantemente, de forma a justificar a naturza dialética do conhecimento. Mas a vida acadêmica tem um outro outro lado: a solidão. Não é fácil lidar com a solidão de uma pesquisa, que pressupõe horas e horas de leitura, compilação de dados e redação. É claro que se trata de uma solidão diferente, já que, paradoxalmente, o pesquisador está muito bem acompanhado. Afinal, livros são excelentes companheiros. O fato é que o período de solidão acadêmica é bastante salutar e o seu resultado - a pesquisa finalizada - é algo muito especial para o pesquisador. Assim aconteceu com o meu Mestrado. Espero que a solidão do Doutorado desemboque no mesmo mar.

segunda-feira, 28 de julho de 2008

Meu bairrismo em "Mulheres do Brasil"

O filme Mulheres do Brasil foi uma grata surpresa para o meu fim de semana. Ali estão reunidas histórias de vida de brasileiras de diversas origens, enfatizando dramas, sonhos e paixões. Há uma interessante ponta de humor em cada narrativa, mas o toque especial fica por conta do misto de ficção e documentário, já que apresenta depoimentos reais daquelas que poderiam ser as personagens da ficção: componentes de escolas de samba do Rio de Janeiro, prostitutas do Rio Grande do Sul e, o que mais me encantou, rendeiras do Pontal da Barra, em Maceió. Não esperava um destaque tão forte ao cotidiano das rendeiras de filé e ao folclore local. O cenário são as belas paisagens da Lagoa Mundaú e as praias de Ponta Verde e Pajuçara. É sempre muito bom ver a minha terrinha em destaque pelo que há de belo e rico em termos de paisagem e cultura. Vale a pena conferir!

sábado, 26 de julho de 2008

A vida agradece

Um mês após a entrada em vigor da Lei Seca, que pune com mais severidade o motorista que houver ingerido qualquer quantidade de bebida alcoólica, temos muito a comemorar. As estatísticas demonstram uma redução de cerca de 63% em casos de acidentes de trânsito no Brasil. Em outras palavras, muitas vidas salvas a cada dia.A alteração do Código de Trânsito Brasileiro pela Lei Seca assustou muitos motoristas e causou grande impacto na população. Está proibido o consumo de bebida alcoólica? Não. O que se proíbe, acertadamente, é a perigosa combinação do álcool com a direção de automóveis. Não se trata, portanto, de uma censura de caráter moral, mas de uma limitação com fundamentos técnicos. O que está em jogo é a capacidade do motorista de guiar com segurança, sem colocar em risco a vida de transeuntes, de outros motoristas e a sua própria vida. Quer beber? Fique à vontade, mas vá de táxi, de carona com um abstêmio ou a pé. Leis que estabelecem interditos aos indivíduos sempre causam estranheza e resistência. É natural. Afinal, como afirma Jean-Paul Sartre, o homem está condenado a ser livre. Mas há aqui um porém: liberdade pressupõe responsabilidade e respeito aos outros. Não é possível que, em nome da liberdade, permaneçamos em estado de vulnerabilidade no trânsito, testemunhando silenciosamente acidentes que ceifam milhares de vidas.Muitos questionam se a Lei Seca não seria a ponta do iceberg da implementação de um sistema de tolerância zero semelhante ao modelo norte-americano. Penso que não. Embora todo recrudescimento da lei deva ser bastante criterioso, sobretudo em um País como o Brasil, marcado pela desigualdade social, é preciso separar o joio do trigo. Uma coisa é criar políticas públicas xenofóbicas ou que encontrem fundamento na marginalização da pobreza, a exemplo da imposição da Lei Seca exclusivamente em bairros pobres da capital alagoana, sob o argumento de redução da violência. Outra coisa é contribuir para uma mudança de hábitos no trânsito, com o intuito de proteger a integridade física da população. São situações distintas e isso precisa ficar bem claro. O fato é que as novas regras de trânsito já provocaram algumas mudanças interessantes e demonstram a criatividade do povo brasileiro. Bares e restaurantes disponibilizam carros e motoristas para seus clientes e esses, por sua vez, descobrem que taxistas podem ser bons companheiros para as noites regadas a álcool. Quem agradece é a vida.
Publicado na Gazeta de Alagoas, em 26/07/2008.

Artigos da Gazeta de Alagoas

Tenho contribuído semanalmente com artigos para o caderno Opinião, da Gazeta de Alagoas, jornal de maior circulação do nosso Estado. Por sugestão do meu amigo Sérgio Coutinho (maior incentivador da criação do meu blog), passarei a colocá-los aqui também, abrindo espaço para debates. Aguardo os comentários.

sexta-feira, 25 de julho de 2008

Sobre o silêncio

Estava pensando sobre o que escrever e eis que Sofia (uma das escritoras mais talentosas que já conheci) aparece no msn e começa a comentar a minha menção ao silêncio no post anterior. O que dizer do silêncio? Ele fala mais do que palavras e é permeado por entrelinhas tão interessantes... Além disso, nem sempre "quem cala, consente". Quem cala, fala. Já que "silêncio" lembra "vazio", recordo aqui aquela música de Chico Buarque: "É sempre bom lembrar que um copo vazio está cheio de ar". Prato cheio (!) para os psicanalistas.

Sobre o título do meu blog

A palavra "diálogo" passou a ter um significado especial para mim desde o dia em que ouvi um professor de semiótica ressaltando a natureza dialógica do ser humano. Ele tratava das estruturas monológicas (e inadequadas) das penitenciárias e explicava a importância dos espaços arquitetônicos para a plenitude do diálogo, que não se dá apenas através de palavras, mas de gestos, olhares e silêncios. Talvez aquilo tudo tenha me encantado porque focalizava a questão carcerária, que é tema da minha pesquisa de doutorado, ainda em andamento. Mas não foi só isso. A ênfase na nossa natureza dialógica me fez logo pensar em outras esferas também dialógicas da convivência humana, que estão diretamente relacionadas com minhas maiores inquietações (e paixões), como a arte e a cultura. Assim, sempre que penso na humanidade, penso em diálogos. Foi daí que nasceu o título do meu blog. Espero que tenhamos bons diálogos aqui!